E foi logo a primeira de suas 41, conquistada sob forte chuva no GP de
Portugal de 1985, dia 21 de abril, quando o tricampeão ainda estava em
sua segunda temporada na Fórmula 1 e corria pela Lotus. Quem garante o
lugar especial que o triunfo tinha na memória de Senna é o jornalista
inglês Nigel Roebuck, um dos poucos que estava cobrindo a prova no
Estoril e que segue acompanhando o 'circo' até hoje.
"Quando
perguntei a Ayrton se a vitória de Donington [em que foi de quinto a
primeiro na primeira volta e venceu com 1min23 para o segundo colocado]
havia sido sua melhor, ele disse: 'Não! Claro que aquela foi boa, e não
foi fácil – mas não foi como Portugal em 1985. Em Donington eu tinha um
[motor] Cosworth, mas em Estoril tinha o Renault turbo – era muito mais
potência! Mas a maior diferença é que agora temos controle de tração, e
naquela época não...'", lembrou o jornalista ao UOL Esporte.
"Eu
poderia entender por que a vitória do Estoril na Lotus-Renault era tão
importante para ele. Não foram muitas pessoas que estiveram lá para
assistir, mas foi um daqueles dias em que todos tinham certeza, mesmo
durante a prova, que estávamos assistindo a uma corrida destinada a
construir uma lenda", defende Roebuck. "Assisti à prova na primeira
curva com Denis Jenkinson [um dos jornalistas mais respeitados da época]
e lembro como ele estava exultante quando Senna cruzou a linha de
chegada: 'É um novo Villeneuve, não é? Um piloto que sempre está à
frente de seu carro'", comparou. Gilles Villeneuve, lenda da Ferrari
entre os anos 1970 e 1980, era conhecido pela agressividade.
"Algum tempo depois eu mencionei isso a Ayrton, e ele ficou muito grato
com a comparação com Gilles. 'Mas não estava sempre à frente do carro.
As condições estavam tão ruins que as curvas estavam mudando, volta após
volta, e às vezes o carro está me conduzindo'", revelou o brasileiro.Dilúvio em Portugal
De fato, o GP da primeira
vitória de Senna ficou marcada pelas péssimas condições de pista, que
pegaram vários pilotos de surpresa. Era a segunda corrida do campeonato –
e a segunda prova do brasileiro pela Lotus, depois de ter feito sua
temporada de estreia na Toleman.
Ayrton largava pela
primeira vez na pole position – o que se tornaria de praxe naquele ano,
em que foi o primeiro na classificação em sete oportunidades – e a chuva
começou a cair ainda antes da largada, após todas as sessões anteriores
serem disputadas com pista seca. "Nos tempos de hoje as condições eram
tão ruins que a corrida provavelmente começaria com Safety Car, mas na
época nem se pensava nisso", compara Roebuck.
Senna conseguiu
sair bem e foi aumentando sua vantagem na ponta enquanto os rivais
sofriam – no final da segunda volta já tinha 3s de distância para o
segundo colocado. A água era tanta que, depois de 16 voltas, Jacques
Laffite parou sua Ligier dizendo que o carro era inguiável em tais
condições, e Nelson Piquet chegou a parar no box para colocar um macacão
seco antes de também abandonar: os pneus Pirelli da Brabham do
brasileiro não tinham um bom rendimento na pista. "Dentro do carro eu
estava amaldiçoando Bernie [Ecclestone, chefe da equipe] por ter
aceitado o dinheiro da Pirelli", revelaria o piloto. Em determinado
momento, até Senna passou a gesticular no carro, pedindo o fim da prova.
À medida que a chuva ia piorando, contudo, o brasileiro ia abrindo mais
na ponta e mais rivais ficavam pelo caminho. Keke Rosberg, da Williams,
e Alain Prost, da McLaren, bateram na caça ao brasileiro, que abriu
meio minuto depois de 30 voltas. A prova seria encerrada no limite de
2h, duas voltas antes do fim, com Senna batendo Michele Alboreto por
1min02s978. Assim, fez um grand chelem – pole, volta mais rápida,
vitória liderando todas as voltas da corrida - logo na primeira
conquista da carreira.
"Foi sorte"
Mas o
que poderia ser visto como uma pilotagem de outro mundo foi diminuída
por Senna, então com 25 anos. O que ele consideraria sua melhor vitória
nos anos seguintes não lhe pareceu tão fenomenal logo após a bandeirada.
"O maior perigo era que as condições mudavam o tempo todo. Ás vezes a
chuva apertava muito, às vezes nem tanto. Não conseguia ver nada atrás
de mim. Era difícil até manter o carro na reta e certamente a corrida
poderia ter sido paralisada. Em um momento eu quase rodei na frente dos
pits, como Prost", revelou.
"As pessoas estão dizendo que não
cometi erros, mas não têm ideia de quantas vezes eu saí da pista! Em
certo momento estava com as quatro rodas na grama, tinha perdido o
controle... mas de certa forma o carro voltou para o circuito. Todos
disseram 'que controle fantástico' mas foi só sorte – e sorte, também,
que isso não apareceu na TV", brincou.
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